Parte 5 – Alocação de Recursos e Distribuição da Riqueza

Porém, é preciso ocorrer mais do que apenas crescimento econômico. É necessário que existam “veículos” para investimentos de “portfólio” como títulos e valores mobiliários que tenham liquidez, caso contrário, podemos ter recursos para investir, mas faltarem ativos “investíveis”. O Brasil evoluiu bastante em termos de veículos para o investimento, mas ainda precisa melhorar bastante.

Antigamente a forma mais comum das pessoas formarem um patrimônio que lhes gerasse renda na inatividade era comprar imóveis ou criar um negócio próprio. Isso não é mau investimento e, pelo menos um imóvel deve fazer parte da sua carteira. No entanto, este investimento tem pontos negativos, o principal deles é a falta de liquidez. Se você precisar transformá-lo em dinheiro rápido provavelmente perderá valor. Por isso, diversificar o portfólio em ativos mais líquidos é uma boa recomendação.

O grande provedor de ativos fungíveis e de fácil negociação é o mercado de capitais. No Brasil ele é razoavelmente evoluído, mas pode ser bem melhor. Tanto é necessário que o mercado secundário de títulos de dívida deslanche (aí poderemos ter uma verdadeira marcação à mercado) como a quantidade de empresas de capital aberto precisa crescer.

O Brasil tem hoje menos do que 500 empresas de capital aberto. Dessas como menciona Pedro Rudge em artigo do Valor Econômico [1], cerca de 200 são “invertíveis”. A Austrália, com uma economia menor que a brasileira, tem em torno de 2 mil empresas listadas. A Inglaterra tem quase 3 mil e os EUA 5 mil. Muitos setores da economia brasileira não estão representados e, portanto, não são veículos de investimento para os recursos de poupança dos brasileiros.

Hoje, muitas empresas cujos negócios utilizam os recursos naturais, sociais, humanos, e muitas vezes financeiros do povo brasileiro, só permitem que estes usufruam da sua criação de riqueza por meio da renda do trabalho assalariado e pela redistribuição de renda feita pelo Governo. Não podem se tornar sócios delas. O problema é tão crítico que os gestores mais sofisticados de recursos já se estruturaram para buscar alternativas de investimento fora do país e até os fundos de pensão de empresas brasileiras entre elas, estatais, obtiveram autorização para investir no exterior.

Assim chego ao ponto principal desta série de blogs. A importância do desenvolvimento do mercado de capitais em um país capitalista no qual existe o conceito de propriedade privada não se dá só por causa do provimento de recursos para as empresas expandirem os seus negócios, mas também para permitir melhor alocação de recursos entre o presente e o futuro, por grau de liquidez, por nível de risco e para que os brasileiros usufruam da riqueza gerada por elas como sócios capitalistas. Ou seja, a distribuição da riqueza do país não deve ser pensada só pela ótica da remuneração direta do trabalho, serviços públicos ou transferência de renda, mas também pela pulverização da propriedade das entidades econômicas que proveem o sustento da sociedade.

Esta forma de pensar dá maior liberdade aos indivíduos escolherem como querem gerir o fruto do seu trabalho e planejar sua remuneração quando estiverem na inatividade. Esta gestão não deve ficar inteiramente sob a responsabilidade do governo, até porque nossos já demonstraram que maus gestores dos nossos recursos. Por outro lado, liberdade implica em maior responsabilidade – pois cada um dependerá muito mais de si próprio. Para isso é necessário que haja uma profunda mudança cultural no país: o abandono do mito que há um grande pai, representado pelo Governo que laça mão dos recursos do Estado, que vai cuidar de nós. Até porque ele já não cuida ou cuida muito mal. Para isso obter educação financeira e de governança corporativa são alicerces fundamentais.

Conclusão:

  • As sociedades são sustentadas pelas pessoas que trabalham hoje;
  • Parte do rendimento desse trabalho deve ser investida em atividades que gerem riqueza e renda no futuro – deem retorno no longo prazo;
  • Ainda que parte deste investimento seja feito por intermediação do Estado, deve existir espaço para que os indivíduos apliquem suas poupanças de forma livre em investimentos de sua escolha sem esta intermediação;
  • Para que haja oportunidade de melhor alocação de recursos no tempo e diversificação de risco é importante existirem instrumentos fungíveis como ações e títulos de dívida que tenham maior liquidez, acessíveis a pequenos poupadores diretamente ou por meio de gestores profissionais;
  • Aumentar a oferta desses títulos significa incentivar as empresas abrirem seu capital para que poupadores brasileiros tenham acesso à riqueza que geram se utilizando dos recursos naturais, humanos e financeiros do país, como sócios capitalistas e não apenas por meio da renda do trabalho ou por mecanismos redistributivos como saúde pública e educação;
  • Neste contexto, indivíduos investidores precisam ter educação financeira e saber o que é governança corporativa, pois serão eles próprios os responsáveis pelo acompanhamento dos investimentos que fizerem ao longo da vida para provê-los na inatividade;
  • Os recursos investidos em empresas contribuirão para o crescimento do PIB aumentando o tamanho da riqueza a ser dividida;
  • Para reduzir o risco de um cataclismo previdenciário é preciso que o sistema de previdência pública se guie por um princípio renda mínima e se equilibre, eliminando a aposentadoria por tempo de contribuição, adiando a idade de aposentadoria para novos entrantes conforme o aumento na expectativa de vida e criando regras de transição inversamente relacionadas à sua e a atual idade de aposentadoria;
  • A sociedade precisa mudar sua visão em relação à idade em que o indivíduo se torna idoso se há aumento na expectativa e na qualidade de vida, eliminando subsídios para aposentados e entendendo que é necessário trabalhar por mais tempo antes de se aposentar;
  • As empresas têm a obrigação de repensar suas estruturas de custo, modelo de trabalho e emprego para criar mais empregos e com características diferentes possibilitando que as pessoas fiquem empregadas por mais tempo e repensando a alocação do trabalho levando em conta o fator idade;
  • A sociedade brasileira precisa se tornar adulta, isto é, assumir a responsabilidade por seus atos e a condução do seu futuro, abandonando de vez a ideia de que os problemas serão resolvidos por um grande pai representado pelo Estado para quem o dinheiro cai do céu. O Estado, gerido pelo Governo faz apenas tirar de uns para dar para outros, ficando com enorme fatia para sustentar a si próprio. O Governo brasileiro então, já demonstrou inúmeras vezes, ser péssimo gestor do dinheiro alheio.

 

[1] “Enquanto os IPOs não vem”, Valor Econômico (14/2/2013).

 

por Silvia Pereira

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