O filósofo grego Platão em sua obra “A República” fala sobre a organização social daquela época, conforme pode ser visto no texto abaixo, adaptado do livro Imagem da Organização, de Gareth Morgan (2002):

“Num cenário imaginário, uma caverna subterrânea possui uma entrada voltada para a luz de uma fogueira. Nesta caverna encontram-se pessoas acorrentadas que não podem se mover. Estas pessoas conseguem ver somente a parede da caverna diretamente à sua frente. A parede, iluminada pela claridade das chamas, recebe a projeção das sombras das pessoas e objetos que passam lá fora. Os prisioneiros tomam as sombras por realidades, atribuindo-lhes nomes, conversando com elas e até mesmo associando os sons de fora da caverna aos movimentos que observam na parede. Para eles, este universo sombrio constitui sua realidade, já que não conhecem nenhum outro.

Se um dos cativos fosse autorizado a deixar a caverna, iria perceber que as sombras são apenas reflexos obscuros de uma realidade mais complexa, e que o conhecimento e as percepções de seus antigos companheiros de caverna são imperfeitos e distorcidos. Se ele voltasse à caverna, não conseguiria mais viver como antes, pois agora para ele o mundo real seria um lugar bastante diferente. Sem dúvida, teria dificuldade em aceitar seu confinamento e sentiria pena dos companheiros. Se tentasse compartilhar com eles seu novo conhecimento, provavelmente seria ridicularizado por suas ideias, porque, para os prisioneiros da caverna, as imagens com as quais estão acostumados possuem muito mais significado do que um mundo que eles nunca viram. Além disso, já que a pessoa portadora desse novo conhecimento não seria mais capaz de agir com convicção em relação às sombras, seus companheiros de prisão começariam a ver o mundo exterior como um lugar perigoso, algo que deveria ser evitado. A experiência poderia, na verdade, levar os prisioneiros a se apegar ainda mais à sua maneira habitual de encarar a realidade”.

É claro que este texto está relacionado a contextos bem mais amplos, como o universo da forma que atualmente é conhecido, e até mesmo com a realidade física e material da existência. Mas reduzindo este escopo para algo mais estrito, o texto também tem relação com os 30 ou 40 anos do tempo de vida que cada pessoa passa trabalhando e aprendendo num ambiente empresarial. Hoje em dia, a geração Y é questionada porque passa apenas 3 a 5 anos numa empresa e, sem motivo aparente, deseja mudar-se para outro ambiente, outra organização às vezes de outro segmento de mercado. Um volume acentuado de tempo vivido dentro de uma mesma caverna (cultura organizacional) pode lançar o profissional na armadilha do “modo de pensar aprovado”. Este tipo de cilada levou as montadoras americanas, nos anos 80, a perder espaço para seus rivais japoneses, por estarem presos ao modo americano de produzir carros.

Alguns tipos comuns de sombras que uma caverna empresarial pode gerar são as seguintes:

  1. Cegueira Grupal: As pessoas são levadas por ilusões ou percepções grupais que têm caráter auto isolante;
  2. Síndrome de Estocolmo Empresarial: Na tentativa de integração e conquista da simpatia da empresa, a pessoa passa a executar práticas que acha (e são) indesejáveis, defendendo-as nos ambientes externos à organização;
  3. Mecanismos Grupais de Defesa (Caverna Fechada): Informações, práticas e casos de sucesso de outros segmentos de negócio não são bem vindos com o argumento de que “não se aplicam à nossa realidade”; muitas vezes nem as práticas de fornecedores e concorrentes são estudadas; grupos muitas vezes regridem a padrões infantis de comportamento para se defender dos desconfortáveis aspectos do mundo real;
  4. Ilusão de Controle: Os indicadores de desempenho não são utilizados para medir e melhorar os processos produtivos e de negócio da organização, mas sim de forma distorcida para defesa e garantia da perenidade dos indivíduos na função; desta forma estes indicadores nada indicam, nada é realmente controlado;
  5. Bloqueios Inconscientes à Inovação e à Mudança: Expressões como “em time que está ganhando não se mexe” ou “isto sempre foi feito e deu certo desta forma” são bloqueadores da melhoria contínua, dos novos métodos de trabalho, dos novos produtos, dos oceanos azuis e, em última análise, da sobrevivência da organização.

De acordo com a psicologia freudiana, em qualquer ambiente social, incluindo às organizações empresariais, as pessoas se defendem destas armadilhas banindo para o inconsciente seus impulsos e desejos de reagir a elas, de várias formas (MORGAN, 2002):

a) Repressão: Empurrar impulsos e idéias indesejadas para o inconsciente;

b) Negação: Recusar-se a admitir um fato;

c) Transferência: Direcionar seus impulsos para algo mais seguro;

d) Fixação: Adesão rígida a uma determinada atitude ou comportamento;

e) Projeção: Atribuição dos próprios sentimentos ou impulsos a outras pessoas;

f) Introjeção: Internalização de aspectos do mundo exterior na psique;

g) Racionalização: Criação de esquemas de justificação que disfarçam as reais intenções;

h) Reação: Conversão de uma atitude ou sentimento em seu oposto;

i) Regressão: Adoção de padrões infantis a fim de reduzir as exigências do ego;

j) Sublimação: Canalização dos impulsos básicos para formas socialmente aceitáveis;

k) Idealização: Valorização dos aspectos positivos de uma situação para proteger-se dos negativos;

l) Desintegração: Isolamento de diferentes elementos da experiência para proteger o bom do mau.

A solução para evitar que os mecanismos utilizados para defender a pessoa das armadilhas psíquicas geradas pelo funcionamento das organizações sejam maléficos à saúde e ao bem estar do indivíduo vem de uma combinação de duas práticas: A do autoconhecimento, que é o conhecimento do estado mental de si mesmo, incluindo suas crenças, desejos e sensações; e a da consciência (= conhecimento + admissão) de que estes ardis psíquicos existem e podem aprisionar o ser humano em uma caverna organizacional. A Ioga; o Zen-Budismo; a Psicoterapia de base somática (como a Biossíntese); e as técnicas do Avatar são práticas conhecidas e adotadas por muitas pessoas. A educação nestas e em outras técnicas e práticas de autoconhecimento deveria fazer parte do arsenal de treinamentos ocupacionais das áreas de T&D (Treinamento e Desenvolvimento) das organizações.

 

Instrutor Walter Gassenferth

Consultor associado da LCM Treinamento Empresarial

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