Em sua passagem pelo planeta, o ser humano representa muitos papéis, tais como os de filho, marido, amigo, pai. Dentre estes papéis está o de profissional trabalhador. Neste personagem, em especial, ele é considerado um recurso humano; colocado num mesmo rol dos recursos financeiros, logísticos e de informação de uma organização. A atriz britânica Audrey Hepburn, costumava dizer em suas entrevistas em Hollywood que “Pessoas, muito mais que coisas, devem ser restauradas, revividas, resgatadas e redimidas; jamais jogue alguém fora.”. Uma pessoa pode trabalhar muito mal em determinado dia, tendo inclusive um relacionamento ruim com seus colegas, devido a um problema pessoal que a está incomodando, como a enfermidade de um ente querido; mas naquele mesmo mês pode ter uma ideia brilhante que reduza os custos da empresa ou aumente sua receita, compensando com sobras seu baixo desempenho na primeira ocasião.
As novas gerações de pessoas do planeta, apelidadas de gerações Y e Z vêm apresentando dificuldades na realização deste papel de profissional trabalhador, permanecendo pouco tempo em cada emprego, principalmente as pessoas mais preparadas, em função do confronto de suas características pessoais com as práticas das empresas de lidar com os tais recursos humanos.
Para que se entenda esta aparente rebeldia, é preciso conhecer algumas características da geração Y, que não se encaixam com esta forma de tratar as pessoas nas organizações: superestimam seu potencial realizador demonstrando confiança excessiva nas suas competências e habilidades; buscam sempre novas tecnologias; aceitam melhor os feedbacks de seus pares e ídolos, do que de seus gerentes e supervisores; vivem conectados às redes sociais. É de impressionar como se ignora o fato de que um grupo de pessoas mais informadas, com maior grau de conhecimento sobre vários avanços científicos e tecnológicos, criadas com maior abertura para externar suas ideias e seus quereres, não aceita ser tratado da mesma maneira que as gerações X e Baby Boomer foram tratadas em suas chegadas ao mercado de trabalho.
Maior ainda será o problema da geração que está chegando ao mercado, a chamada geração Z, cujas principais características, no que diz respeito à esta relação, são: têm uma capacidade nata de multiprocessamento; não acreditam em fazer uma só coisa para o resto da vida ou passar sua vida profissional em uma só empresa; ganham dinheiro com home office: blogs, mídia, venda de anúncios no YouTube, publicidade (Ex.: Fiverr). Segundo especialistas, poderá haver uma “escassez” de médicos e cientistas no mundo pós-2020 justamente por isso. Ou seja, a dificuldade de encaixar este perfil de pessoas numa organização que trata as pessoas como recursos será exponencialmente maior que a tentativa de encaixe da geração Y, que ora se desenvolve.
Gary Hammel, economista especialista em gestão, fundador da consultoria Strategos, e professor da London Business School, afirma em seu livro “O Que Importa Agora – Como Construir Empresas à Prova de Fracassos” (2012) que as empresas, em função das novidades às quais estão submetidas hoje, como as mídias sociais, os mercados emergentes, a colaboração virtual, a inovação aberta e a sustentabilidade, terão que responder a cinco questões que determinarão seu desenvolvimento ou fracasso nos anos vindouros:
- Que valores morais as empresas devem adotar para que haja confiança do mercado e se reduzam os ônus regulatórios?
- Como provocar inovações constantes nos produtos/serviços, nos processos, nos negócios, e na gestão organizacional, tratando-as como tarefa de todos, durante todo o tempo?
- Como acelerar a renovação das estratégias para acompanhar as aceleradas mudanças do mercado, promovendo uma adaptabilidade das pessoas mais natural, e não provocada por crises, tornando esta adaptabilidade tardia, traumática e dispendiosa?
- Como reduzir os assassinos do entusiasmo, como regras mesquinhas, estruturas piramidais e objetivos corriqueiros, prestigiando mais a competência e o entusiasmo; a paixão pela vontade de mudar, a insatisfação com a situação vigente?
- Como mudar a ideologia do controle, ou seja, o foco no orçamento, nas metas de desempenho, nas políticas operacionais e nas normas de trabalho, para a ideologia dos princípios de negócios, que contempla o foco no produto inesperado, na campanha de mídia inusitada, na experiência inovadora do cliente?
Todas estas perguntas só podem ser respondidas com investimentos nas pessoas: valores, criatividade (para inovações), adaptabilidade, paixão, ideologia são características pessoais, muitas delas vigorosamente presentes nas pessoas das gerações Y e Z.
Os fatores a serem trabalhados hoje nas pessoas, seja numa instituição de ensino, ou numa organização de mercado, são suas competências, sua cognição e criatividade, sua capacidade de comunicação, cooperação, convívio e competição sem conflitos, sua consciência, além de seu comportamento e cultura, visando um melhor aproveitamento, uma maior integração ao ambiente. Um resgate, uma redenção das pessoas, nas palavras de Audrey Hepburn.
Portanto, dizer que pessoas são recursos humanos, e pior, trata-las como tal, é um equívoco que certamente não conseguirá se sustentar com esta nova geração de profissionais trabalhadores. Citando o poeta Caetano Veloso “Gente é para brilhar”.
Referências:
HAMEL, Gary. O que Importa Agora: Construindo Empresas à Prova de Fracassos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2012.
Instrutor Walter Gassenferth
Consultor associado da LCM Treinamento Empresarial