Há algum tempo, venho observando que as pessoas estão buscando mais as diversas religiões ou a filosofia oriental, na tentativa de encontrar apoio existencial e até um maior sentido para suas próprias vidas.

Em junho de 2005, inspirada em dois artigos, em diferentes revistas e com enfoques absolutamente distintos, publiquei um artigo (parcialmente transcrito abaixo) fazendo algumas reflexões sobre a relação entre felicidade e espiritualidade.

O primeiro artigo, publicado pela revista Exame (30/03/05), analisa uma pesquisa feita com empresários brasileiros, onde o LUCRO aparece em oitavo lugar, na visão dos mesmos, sobre os objetivos das empresas, antecedido por finalidades sociais tais como: contribuições para a comunidade, responsabilidade social e os cuidados com o ambiente, enfim, aspectos que colocam o lucro num lugar bem pouco significativo. Segundo a matéria, parece existir um sentimento “latente” de que “ter lucro é pecado”, como de alguma forma acabam pregando as Igrejas. Considerando que somos um país predominante católico é fácil entender, basta, para isso, nos reportamos à famosa obra de Max Weber – “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, para encontrar explicações sobre a forte relação entre a religião e o capitalismo.

O outro artigo, da revista Super Interessante (abril 2005), apresenta algumas pesquisas americanas sobre o conceito e a busca de felicidade, trilhando caminhos que vão da psicologia à filosofia e à religião.

Relacionando os dois artigos fui à Internet fazer uma pesquisa sobre espiritualidade nas organizações, identifiquei 30.700 sites, só no Brasil sobre o tema. Este dado demonstra o quanto este assunto é bastante atual e de amplo interesse, ainda que, na prática, não se percebam grandes mudanças no ambiente empresarial.  Afinal, a conquista do espaço “das emoções” e do afeto ainda é bem recente, para se pretender o desenvolvimento da dimensão espiritual, num mundo que ainda é bastante materialista, científico, cartesiano.

Talvez todas estas aceleradas mudanças por que passa o mundo, neste início de milênio, este sentimento de caos, que às vezes temos, contribua para a busca de novos valores e, dentre os quais, a espiritualidade. Por exemplo, o sentimento de solidariedade, que se manifesta de forma bastante evidente, quando ocorre alguma grande catástrofe em qualquer lugar do mundo, que em face da velocidade da tecnologia da informação, de imediato os povos se mobilizam para algum tipo de ajuda às vítimas.

De qualquer forma, como todo processo de mudança de atitudes, que impacta tanto a organização quanto à sociedade de modo geral, começa-se a perceber um movimento sutil nesta nova direção. Talvez, possamos entender que, a crescente publicação de livros de autoajuda e sobre temas de espiritualidade, possa ter relação com esse fato. Em algumas organizações, os programas de saúde do trabalhador extrapolam as ações voltadas para a alimentação, atividades físicas, prevenção e cura de doenças e chegam até as ações que promovam o bem-estar físico-mental- emocional e que ajudem na conquista da harmonia interior.

Já encontramos em algumas organizações espaços “físicos” e “virtuais” para algumas manifestações religiosas, que estão diretamente relacionadas a atitudes de suas Diretorias, que têm a religião como valor importante e adotam, em suas comemorações e comunicações, este tipo de referência. Observa-se aí, uma tendência a confundir a espiritualidade com religião. Na verdade, a espiritualidade pode levar a uma religião e ao mesmo tempo pode ser desenvolvida também através dela, ainda que não signifiquem a mesma coisa. A palavra religião vem do latim religare e significa “ligar novamente com Deus”. A religião também depende das crenças do indivíduo, pois, para praticá-la, é necessário aceitar uma série de dogmas nos quais a religião se baseia.

O que podemos ressaltar, nas pesquisas realizadas, é um acentuado desejo do homem de ter uma preocupação com aspectos éticos e morais, de dar sentido à sua existência e ainda, de poder contribuir para a melhoria da sociedade. Independente da religião que o indivíduo escolha para manifestar suas crenças, um ponto é básico nesta discussão: existe uma forte correlação entre espiritualidade e ética.

Em tudo que lemos, percebemos uma íntima relação entre o conceito de felicidade e espiritualidade (não a religião necessariamente). Isto diz respeito à busca de um significado maior para a própria existência, – a busca da “realização”, originada por um ato de bondade, caridade, amor, ou por outros sentimentos nobres.

A literatura sobre o tema felicidade tende a defender a tese de que o dinheiro e os bens materiais não garantem a felicidade, o que encontra respaldo na maioria dos conceitos sobre a espiritualidade, pois, desde a filosofia grega, conhecemos o paradoxo: matéria X espírito ou corpo X alma. E, de lá para cá, as pesquisas, de alguma forma, tendem a ratificar essa tendência. Para gerar mais polêmica ao tema, o estudo feito com pessoas de várias partes do mundo, pelo americano Ed Diener mostra que, apesar de nos países ricos o “índice de felicidade” ser alto, também se identificam altos índices de felicidade, em países pobres da América Latina, inclusive no Brasil, onde sabemos que existe uma expressiva desigualdade social, mas, onde temos também, hoje, uma série de ações de combate à fome e a pobreza.

Retornando o nosso foco para as organizações, sabemos, por experiência pessoal, o quanto o lado profissional e o trabalho contribuem para a nossa felicidade, não só pelo tempo que ocupam em nossas vidas, mas, fundamentalmente, pela possibilidade de realizarmos, desde as nossas necessidades mais básicas, até aquelas mais complexas, relacionadas ao crescimento pessoal e espiritual. Isso ocorre quando se faz um trabalho em que nos sentimos contribuindo para a nossa missão pessoal e também para agregar algum tipo de valor ao universo. Por outro lado, não podemos deixar de considerar que, tudo isto passa por questões muito simples, como a forma como o Ser Humano é tratado dentro das organizações, e como se estabelecem as relações interpessoais, em todos os níveis. Não podemos pensar em organizações espiritualizadas, onde além do cumprimento das leis, não haja também um profundo compromisso em preservar a dignidade humana e aquilo que as pessoas têm de mais essencial: seus valores.

Temos aí um grande desafio para os gestores de pessoas: contribuir para a “construção” de empresas mais espiritualizadas. Para isto, vale refletir sobre um dos ensinamentos de Mahatma Gandhi: “A felicidade é o caminho. Portanto, não existe o caminho para a felicidade”. Por isso, amigo resta-nos caminhar! Muita paz! (Publicado em Junho 2005)”.

Consultora Denize Dutra 

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